domingo, 6 de maio de 2012

www.aquelesamba.com.br

Caros amigos,

O blog mudou de cara e de endereço. Muitas novidades estão à caminho.
Agradeço a todos que cutem o blog desde de 2010 e convido a continuarem acompanhando no 
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terça-feira, 1 de maio de 2012

O Sambista e o Trabalho


Viver dignamente e sustentar uma família a partir da música nunca foi tarefa fácil no Brasil. Poucos conseguiram. Para garantir o pão de cada dia, muitos dos maiores expoentes de nosso samba exerceram profissões tradicionais (ou nem tanto) durante a vida.

O Divino Cartola era servente de pedreiro quando adotou o chapéu coco em seu visual e ganhou o apelido que o consagrou. Já na velhice, foi redescoberto por Stanislaw Ponte Preta trabalhando como lavador de carros em uma garagem no Centro do Rio. Nelson Cavaquinho foi policial e conheceu a boemia patrulhando os morros cariocas. Mestre Candeia também e, nessa condição, foi parar em uma cadeira de rodas. Zeca Pagodinho foi apontador de jogo do bicho ou “corretor zoológico” como o próprio prefere nomear a profissão. O polivalente Ary Barroso foi um dos maiores radialistas do Brasil, além de locutor de futebol e político. Walter Alfaiate adotou como sobrenome a profissão de uma vida. O grande Wilson Moreira, vejam só, foi carcereiro até se aposentar. Dona Ivone Lara só se dedicou inteiramente ao samba após a aposentadoria de uma carreira dedicada à enfermagem e à assistência social. João Nogueira trabalhou na Caixa Econômica e Wanderlei Monteiro no Banco do Brasil. Martinho da Vila foi Sargento do Exército Brasileiro. Meu compositor Paulista preferido, Paulo Vanzolini, é zoólogo altamente renomado nos meios acadêmicos. O grande Moacyr Luz criou o Samba do Trabalhador, que lota o Clube Renascença no Andaraí nas tardes de segunda, e, bem antes disso, Martinho da Vila gravou o Samba do Trabalhador de Darcy da Mangueira que reproduzimos abaixo.

E tem gente que diz que sambista é vagabundo.

domingo, 29 de abril de 2012

A Rosa de Pixinguinha


Pausa na roda de samba para falarmos de uma das mais belas canções da História do Choro: a valsa Rosa do Mestre Alfredo da Rocha Viana Filho, o Pixinguinha. Um primor tanto na versão original, sem letra, quanto na versão mais conhecida com letra de Otávio de Souza. Além da beleza ímpar, a música possui algumas curiosidades. Vamos a elas.

Segundo o próprio autor, a valsa foi composta em 1917 e o título original era Evocação. Como manda a regra e a tradição do Chorinho, a música foi composta em três partes. Mais tarde, recebeu letra apenas para primeira e segunda partes e foi gravada e regravada muitas vezes dessa forma. Há alguns anos atrás, a versão original, em três partes e sem letra, foi regravada para o box Choro Carioca, Música do Brasil lançado pela gravadora Acari.

 A letra de Rosa é um capítulo à parte. Rebuscada, parnasiana e lindíssima foi composta pelo improvável Otávio de Souza. Otávio era um mecânico de profissão que morreu jovem e nunca compôs nada parecido com Rosa. Um compositor de uma única música, uma obra prima.

Conta a lenda que Otávio se aproximou de Pixinguinha enquanto o Mestre bebia em um bar do subúrbio carioca para falar que havia uma letra que não saía de sua cabeça toda vez que ouvia a valsa. Pixinguinha ouviu e ficou maravilhado.

A gravação do grande Orlando Silva foi a responsável pela popularização de Rosa, com erro de concordância e tudo no trecho "sândalos dolente". Francisco Alves e Carlos Galhardo deixaram de gravar Rosa por terem se recusado a gravar Carinhoso (coisas da MPB!). Outra curiosidade é que Rosa era a canção preferida da mãe de Orlando, Dona Balbina. Após sua morte, em 1968, Orlando  jamais voltou a cantar a canção.

Abaixo a gravação clássica de Orlando e a mais recente de Marisa Monte.

sábado, 7 de abril de 2012

Rodas de samba: Samba da Ouvidor

O último sábado, 31.03.2012, reservou-me uma grata experiência. Em visita ao Rio, para matar a saudade e carregar as baterias, consegui finalmente conhecer o Samba da Ouvidor.

A roda fica na esquina das ruas do Mercado e Ouvidor, coração do Rio Imperial e simpático ponto cultural atualmente, existe desde 2007 e é um dos 05 melhores sambas do Rio de Janeiro, me arrisco a afirmar.
Chegando ao Centro do Rio deparei-me com um fim de tarde maravilhoso, uma roda na calçada, rodeada por botequins da melhor qualidade. O escolhido para prover as geladas e petiscos foi o “Kamikase”.
O samba é brilhantemente comandado por Gabriel Cavalcante, seu cavaquinho certeiro e sua voz grave e potente, herança direta dos melhores seresteiros e boêmios que outrora cantaram por aquelas bandas. Gabriel da Muda, como também é conhecido, é tijucano, músico desde criança e fiel escudeiro do mestre Moacyr Luz no Samba do Trabalhador do Renascença e demais andanças pelo Brasil.
A base harmônica e rítmica é composta apenas por instrumentos tradicionais e o ponto alto da roda de samba é o repertório. Que repertório! Sem concessões, como dificilmente se vê por aí. Sambas antigos, alguns quase inéditos, de Mangueira e Portela se misturam a clássicos do gênero. Quando se canta Candeia, por exemplo, as escolhas fogem do óbvio e privilegiam canções menos famosas, porém igualmente belas.
O ambiente é tranquilo e familiar, formado por gente de todas as idades e tribos. Destaque para os músicos que frequentam e participam eventualmente. Luciana Rabello, a maior cavaquinista que esse País tem, estava lá.

Voltarei outras vezes e recomendo altamente.

Como é bom saber que existem lugares assim, onde o verdadeiro samba é cultuado e apreciado. O Samba da Ouvidor é prova viva que o verdadeiro samba é imortal.
Segue link para o blog dos caras e foto tirada no evento:
http://sambadaouvidor.blogspot.com.br/ 

domingo, 11 de março de 2012

Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito: uma parceria de papel passado (ou quase).


Já contei aqui um pouco da história do gênio do samba e da boemia, Nelson Cavaquinho. É sabido que, para descolar uns trocos, Nelson vendia seus sambas sem qualquer critério e, por esse motivo, tem em sua obra parceiros que nunca souberam o que é compor uma melodia ou um verso de samba e muitos sambas de sua autoria que sequer levaram seu nome.

A grande exceção é Guilherme de Brito, seu grande parceiro da vida toda. Guilherme e Nelson se conheceram na década de 1940 e foi Nelson quem colocou Guilherme nos trilhos dos redutos boêmios do Rio de Janeiro.  Até então, Guilherme, que já se arriscava como compositor, mantinha uma rotina diária de trabalho batendo cartão na mítica Casa Edison.

Guilherme de Brito, nascido em Vila Isabel, conheceu Nelson tocando em botecos nos arredores de Ramos e a empatia foi imediata. Nelson se encantou tanto com o novo parceiro musical que o fez jurar fidelidade musical. Logo ele, que não era fiel nem aos seus próprios sambas. A coisa foi tão séria que Nelson tentou registrar em cartório o trato feito com Guilherme de Brito, fato que só não aconteceu, pois o funcionário riu e explicou para a dupla que tal registro não era possível.

Mesmo sem registro em cartório, a parceria musical entre Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito é uma das mais inspiradas páginas da MPB. Clássicos de lirismo e melancolia ímpares surgiram dessa união.

Abaixo, duas “pedradas”: A flor e o Espinho e Quando eu me chamar saudade.


quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

A parceria de Zeca e Rildo e uma das melhores entrevistas do Pagodinho

Gosto de todos os discos de Zeca Pagodinho, porém quando ouvimos sua discografia em sequência é possível perceber alguns altos e baixos.

Os dois primeiros trabalhos do sambista, lançados pela RGE, são excelentes. Captam nos arranjos e no repertório todo o clima intuitivo e despojado de Zeca.

O primeiro (Zeca Pagodinho, 1986) foi um arrasa quarteirão em termos de vendagem. Todas as 12 faixas tocaram no rádio. O segundo (Patota de Cosme, 1987) tem em seu repertório clássicos como: Maneiras, Sem endereço, Tempo de Don Don, Feriste um coração e o próprio Patota de Cosme, que dá nome ao disco.

Após esse período, Zeca se transferiu para a RCA e fez alguns discos um tanto irregulares, com arranjos mais POP e faixas que não fazem jus ao seu talento. O melhor disco dessa fase, que durou de 1988 a 1993, é Boêmio Feliz, lançado em 1989.

No final de 1993, Zeca Pagodinho se transferiu para a Universal e sua discografia entrou em outro patamar, ganhando um novo padrão de qualidade. Essa guinada tem um responsável, seu nome é Rildo Hora. Quem trouxe Rildo para a trupe de Pagodinho foi Paulão 07 cordas, que o indicou para produzir o primeiro disco da nova fase, já que o próprio Paulão, cotado para o posto, não queria a função.

Rildo assumiu o posto, no qual se mantém até hoje, e inovou em termos de arranjos e qualidade, incluindo violas, cordas, sopros e outras bossas que o produtor sabe incorporar como ninguém ao samba. Deu também outro fôlego ao repertório de Zeca Pagodinho, incorporando novos compositores, até então nunca gravados pelo sambista.

O primeiro disco dessa nova fase é o excelente Samba pras Moças, de 1995. Foi na maratona de divulgação desse disco que Zeca concedeu uma de suas mais inspiradas entrevistas ao programa Jô Soares Onze e Meia, a qual reproduzimos abaixo:

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Nelson Sargento: um sambista de vários talentos


Nelson Sargento é, sem dúvida, um dos maiores sambistas ainda vivos e um dos baluartes da Estação Primeira de Mangueira.

Nelson passou a morar em Mangueira ainda criança. Foi criado por Alfredo Português, figura notória e respeitada no morro. Logo de cara, o ainda rapaz, passou a andar e aprender coisas do samba e da vida com os bambas. Cartola, Nelson Cavaquinho, Aloísio Dias e Carlos Cachaça eram companhias constantes nas noites de samba e boemia. O "sobrenome" Sargento é herança dos tempos de Exército.

Sua fantástica memória ajuda a preservar histórias, tradições e sambas antigos e ainda inéditos da Verde e Rosa. Foi membro da ala de compositores da Escola e compôs sambas de enredo inesquecíveis como “Vale do São Francisco” em 1948 e o antológico “Cântico à natureza” de 1955, considerado um dos mais belos de todos os tempos.

Nos anos 60, participou ativamente das rodas de samba do Zicartola, do espetáculo Rosa de Ouro e foi integrante dos conjuntos A voz do morro e Os cinco crioulos.

Além de sambista e autor de vários clássicos do gênero, Nelson Sargento é renomado pintor, tendo realizado diversas exposições de seus quadros de estilo primitivo. Artista de múltiplos talentos, também fez participações como ator na TV e em filmes.


domingo, 20 de novembro de 2011

O Jogo de Caipira e o Partido-Alto

Em vários sambas e partidos tradicionais há citações sobre o Jogo de Caipira, mas pouca gente sabe do que se trata o tal jogo e que ele possui profunda relação com os fundamentos do Partido-alto.
O Jogo de Caipira nada mais é do que um simples jogo de azar amplamente praticado nos morros e subúrbios cariocas e em outras regiões brasileiras no século passado.  Trata-se de um jogo de dados atirados sobre um tabuleiro com seis casas numeradas. Os jogadores fazem suas apostas, tentando adivinhar a casa onde o dado irá cair. Quem comanda o jogo é o banqueiro, a quem cabe à função de atirar os dados.
A ligação com o Partido-alto está exatamente na função do banqueiro que, ao atirar os dados sobre o tabuleiro, o faz declamando letras (ou lérias, como diziam os antigos), refrãos e frases ritmadas baseadas no folclore e no dia-a-dia das camadas populares.
Um bom exemplo de samba que fala do Caipira está no primeiro disco de Zeca Pagodinho, lançado em 1986. Samba de Nei Lopes e Sereno que resgata o clima dos versos cantados pelo banqueiro e demais participantes do jogo.
PS- Barra Mansa está no samba (!), remetendo à tradição da cultura popular do Vale do Paraíba, mas isso ainda será assunto de outros posts.

domingo, 9 de outubro de 2011

O Trio Mocotó e o Samba Rock

O Trio Mocotó nasceu em São Paulo no ano de 1968, mais precisamente na mítica Boate Jogral. Seus integrantes eram contratados da boate para atuar como banda de apoio dos artistas que lá se apresentavam.

Pelo palco da badalada boate paulistana passaram artistas como Clementina de Jesus, Nelson Cavaquinho, Paulo Vanzolini e até, pasmem, artistas internacionais do quilate de Dizzie Gillespie e Duke Ellington.

Uma das canjas mais freqüentes na boate acabou resultando numa clássica parceria da MPB. De tanto tocar com Trio na Boate Jogral, Jorge Ben acabou fazendo deles sua banda oficial. A formação original Fritz Escovão, Nereu Gargalo e João Parayba gravou com Jorge Ben os antológicos discos: Jorge Ben (1969), Força Bruta (1970) e Jorge on Stage (live in Japan) de 1971.

O nome, Trio Mocotó, vem de uma gíria da época e é resultado da popularização da minissaia, que deixava à mostra o mocotó das meninas.

Da discografia da banda, merecem destaque: Muita Zorra! Ou são coisas que glorificam a sensibilidade atual, de 1971, onde está o hit Coqueiro Verde; Trio Mocotó, de 1973 e Samba Rock, lançado em 2001. O disco de 2001, lançado em banca de jornal, marcou a volta do Trio em sua formação original e mostrou que eles estavam em plena forma.

Abaixo, um especial da TV Cultura, gravado em 1971, e o clipe de Voltei Amor, do disco de 2001.



quarta-feira, 27 de julho de 2011

Sobre Herivelto, Dalva e cabelos brancos

Herivelto Martins foi um grande compositor, uma liderança na luta pelos direitos da classe artística e uma personalidade controversa. Seu relacionamento turbulento com Dalva de Oliveira, uma das maiores estrelas da MPB de todos os tempos, deu origem a inúmeros escândalos e era sempre um prato cheio para a imprensa da época.

Esse relacionamento foi narrado em detalhes em um belo e emocionante livro, escrito pelo filho do casal Pery Ribeiro, chamado Minhas duas estrelas: uma vida com meus pais Dalva de Oliveira e Herivelto Martins, Editora Globo.

Um de seus maiores sucessos foi composto em São Paulo num momento em que Herivelto já havia se separado de Dalva. O compositor passava uma temporada no bairro do Jabaquara, hospedado na casa do irmão, por conta da participação em um filme rodado na capital paulista.

Numa tarde em que fazia compras em uma quitanda próxima à casa do irmão, percebeu que duas senhoras falavam muito mal de sua ex-mulher Dalva de Oliveira. A situação o deixou muito magoado pensando que as duas senhoras estavam falando, pois haviam notado sua presença. Herivelto então, pensou em pedir que as duas parassem e respeitassem sua presença, que respeitassem ao menos seus cabelos brancos. Ao voltar para casa, fez toda a primeira parte da música. A curiosidade contada pelo próprio compositor era que àquela altura ainda não possuía nenhum fio de cabelo branco.

Retornando ao Rio mostrou a “primeira” que havia composto para o amigo e parceiro de composição Marino Pinto. Finalizaram a segunda parte juntos, após visitarem vários bares durante uma noite de boemia. Estava pronto mais um clássico da MPB: cabelos brancos. Uma das muitas músicas que Herivelto Martins fez para seu grande amor Dalva de Oliveira.

Abaixo, link da excelente interpretação de Cabelos Brancos pelo conjunto vocal Quatro Ases e um Coringa, gravada em 1951.